
Foto: José Doval (Zero Hora)
Esse jogo contra o Glória, em Vacaria, marcou uma virada do Grêmio na temporada 1989. Era a última rodada do segundo turno do Gauchão, e o tricolor precisava da vitória para avançar ao quadrangular final do turno e assim manter vivas as chances de ir para o hexagonal final da competição.
Cláudio Duarte, que havia assumido o comando do time no início da semana (Rubens Minelli fora demitido após a derrota nos pênaltis para o Passo Fundo) promoveu a estreia dos recém contratados Hélcio, Jandir e Edinho. A partir daí começou a se firmar a base da equipe que ganharia o pentacampeonato gaúcho e a primeira edição da Copa do Brasil.

Foto: José Doval (Zero Hora)
“GRÊMIO VENCE A GUERRA E VAI PARA O QUADRANGULAR
Na estréia de Cláudio. Duarte, time supera jogo tumultuado e fica a um ponto do HexagonalO Grêmio venceu a “guerra” de Vacaria, ao ganhar do Glória por 2 a 1, e classificou-se ao Quadrangular em segundo lugar no Grupo B, com,11 pontos positivos. O Pelotas ficou em primeiro com 13. Na classificação geral, o time de Cláudio Duarte tem 24 pontos. E precisa de apenas mais um para chegar ao Hexagonal. Em resumo, basta não chegar em último no Quadrangular para que a participação na etapa final do Gauchão esteja assegurada. O adversário do Grêmio na próxima quarta-feira será o Aimoré, em São Leopoldo. No domingo, o jogo acontecerá no Estádio Olímpico, contra o Pelotas.
No Alto da Glória, a confusão foi a marca predominante. O Grêmio atacou durante todo o primeiro tempo. O Glória simplesmente não teve poder ofensivo. E concluiu apenas duas bolas contra o gol de Mazaropi, ambas por Juarez e para fora, sendo uma delas sobre o alambrado, caindo fora do estádio. Enquanto isso, o lateral esquerdo Hélcio, um dos estreantes, mostrava bom futebol e marcava com firmeza. Edinho, era o dono da área. E Jandir, o último dos três reforços recém-contratados, apesar da falta de ritmo, organizava os lances de frente. A partida, até 25 minutos, foi dura, com muitas faltas e enorme tensão. Aí, o ponteiro esquerdo Paulo Egídio lançou urna bola em diagonal para o Almir. O ponteiro driblou Francisco, um mau marcador, passou também por Juarez e chutou forte na saída de Gasperin, aos 30 minutos. O Glória teve que se abrir e buscar o empate. Mas o Grêmio continuou melhor.
Daltro Menezes, aos 37 minutos, tirou Francisco e colocou Zé Roberto em seu lugar. O lateral não acompanhava. Almir. Branco, o mais qualificado atleta de Daltro, não rendeu bem nos primeiros 45 minutos. Com isso, a superioridade do Grêmio implantou-se exatamente a partir do setor de criação.
Tumulto
No segundo tempo, o Glória voltou desesperado. E contou com a intranqüilidade do árbitro Carlos Martins para transformar o jogo em um grande tumulto, com 17 minutos de paralisação. O primeiro desentendimento ocorreu quando Paulão, que entrou em lugar de Edimilson, cruzou uma bola para a área e Rubinho fez o gol. Martins marcou impedimento. Nesta altura, a violência já predominava. Depois, Kita e Juarez chocaram-se de cabeça. O centroavante do Grêmio sofreu afundamento do malar e foi retirado de campo. O zagueiro teve que prosseguir com uma bandagem. Aos 18 minutos, Marcos Vinícius, que substituiu Kita, foi lançado, entrou na área, e foi puxado: pênalti.
O Glória discordou da marcação de Martins e houve invasão de campo de parte do treinador Daltro Menezes e dirigentes. Paulão pressionou Carlos Martins e chegou mesma a dar-lhe um encontrão. A Brigada Militar entrou no gramado. Houve muitas ameaças a Martins. Aos 27 minutos, Edinho bateu a penalidade e fez 2 a 0. Carlos Martins, entretanto, perturbou-se. Aos 33 minutos, expulsou Edinho, que, provocado por Zé Cláudio, estava envolvido em mais uma discussão. Com isso, o Glória cresceu. Aos 37 minutos, Alfinete afastou mal uma bola dentro da área e, na sobra, Zé Cláudio descontou.
Ainda houve tempo para mais atritos. O médico Alarico Endres tentou prestar atendimento dentro do campo e foi agredido. Daltro Menezes insultou e ameaçou Martins. Aos 43 minutos, a partida recomeçou. E foi até 61 minutos. Quase ao final, Cuca aparou um cruzamento e encobriu Gasperin, em gol legítimo. O confuso Carlos Martins apitou impedimento. Contrariou o experiente Justimiano Gularte, que nada tinha assinalado. O Glória perdeu, mas lutou até o fim. E fez de tudo para desestabilizar o sistema nervoso de quem estivesse por perto.” (Renato Barros e Carlos Alberto Fruet, Zero Hora, 1º de maio de 1989)

Foto: Valdir Friolin (Placar)
“A Guerra de Vacaria
Ser gremista no começo de 1989 era um suplício. Em péssima fase, o tricolor não convencia no campeonato gaúcho. Na penúltima rodada da fase classificatória, com a vaga à fase final a perigo, deixou escapar uma vitória fácil contra o Passo Fundo, no Olímpico. Precisaria vencer seu último jogo para conseguir a classificação. E o adversário era ninguém mais, ninguém menos, do que o Glória. E em Vacaria, no Altos da Glória…
Entre o dia do empate contra o Passo Fundo e o jogo contra o “Leão”, o Grêmio desencadeou uma grande mobilização. Chamou Cláudio Duarte para o comando técnico e contratou três reforços: o zagueiro Edinho, capitão do Brasil na Copa de 86, o volante Jandir e o lateral-esquerdo Hélcio. Os recém-chegados teriam pouco menos de uma semana para se adaptarem e absorverem as instruções do treinador.
Seria o suficiente para derrotar o Glória? Além de possuir uma equipe entrosada, o moral estava em alta graças à melhor campanha da competição até aquele momento. Não bastasse isso, o “Leão” não perdia em casa há 24 jogos, quase um ano sem derrota. Cláudio Duarte reconhecia a força do oponente: “O time do Daltro [Menezes] ataca com muita vontade e mostra que está sempre disposto a vencer”.
Não havia dúvida: aquele domingo, 30 de abril de 1989, prometia muita emoção. Todos os olhos voltaram-se para Vacaria. Era lá que o tricolor iria disputar uma das partidas mais decisivas de sua existência. Ironicamente, contra um clube que possuía as mesmas cores e levava “Grêmio” em seu nome. Uma grande expectativa tomou conta da cidade, e os ingressos postos à venda esgotaram-se rapidamente. No data do jogo, a cidade não cabia em si de tanta excitação. Na hora marcada para a abertura dos portões, grandes filas se formavam junto às entradas. Faltando duas horas para o começo do confronto, a lotação do estádio estava completa. Aquelas 8.510 pessoas – recorde de público do Altos da Glória em todos os tempos – testemunhariam um dos episódios mais dramáticos da história do futebol gaúcho: a “Guerra de Vacaria”!
Precisando vencer, o Grêmio iniciou na pressão, não permitindo que Branco e Edmundo organizassem a meio-campo do Glória e fizessem a bola chegar ao perigoso atacante Zé Cláudio. Edinho, Jandir e Hélcio davam segurança ao sistema defensivo, e não havia conclusões contra o gol tricolor. Nos primeiros minutos, a partida mostrava como seria: dura, com muitas faltas e uma tensão gigantesca.
Francisco, lateral do Glória, parecia o mais nervoso. Foi pelo seu setor que, aos 30 minutos, o Grêmio abriu o placar. Paulo Egídio lançou Almir, que passou com facilidade por Francisco, driblou Vladimir e chutou sem chances para Gasperin. Atento, Daltro substitui Francisco por Zé Roberto. Com Branco e Edmundo contidos, o “Leão” não teve forças para reagir, e o primeiro tempo acabou com vantagem gremista. No intervalo, torcedores do Glória agrediam-se nas sociais, prenunciando o clima do segundo tempo.
No retorno, Edmílson entra no lugar de Paulão. A equipe melhora, e Rubinho marca após cruzamento de Paulão, mas o gol é anulado pelo árbitro, iniciando-se grande confusão em campo e a paralisação do jogo. Pior para o auxiliar Carlos Kruse, que assinalou o impedimento: trabalhando junto às gerais, onde apenas o alambrado separa o auxiliar da torcida, passou a ser alvo de cusparadas e xingamentos. Na seqüência, numa disputa de bola pelo alto, Kita e Juarez se chocam. O primeiro sofre afundamento de malar, sendo substituído, enquanto Juarez acusa um profundo corte na cabeça. Bravo, ele volta a campo protegido por uma bandagem, pois o Glória já havia realizado as duas alterações.
Aos 18 minutos, Marcus Vinícius cai na área e o árbitro marca pênalti. O banco de reservas do time da casa invade o gramado e cerca o árbitro Carlos Martins. Após nove minutos de paralisação, Edinho cobra a penalidade, fazendo 2 a 0. Depois de tomar o segundo gol, o “Leão” parte para cima do adversário. Para compensar o prejuízo do time da casa, Martins expulsa Edinho aos 33 minutos. Valente, o Glória pressiona e é recompensado: aos 37 minutos, aproveitando um rebote, Zé Cláudio desconta. Na seqüência, o médico gremista tenta prestar socorro dentro de campo e ocorre nova invasão do banco do time de Vacaria.
O jogo parecia não ter mais fim devido às paralisações, dando um grande suspense à disputa, pois o Glória permanecia no ataque e ninguém sabia, ao certo, quanto tempo restava. Quase ao final, Cuca apara cruzamento e encobre Gasperin, mas o juiz marca impedimento, apesar de o auxiliar Justimiano Gularte nada ter sinalizado. A partida termina aos 61 minutos da segunda etapa. Emocionados, os gremistas comemoram, enquanto dirigentes, atletas e comissão técnica do Glória cercam novamente a arbitragem. Nas gerais, a torcida visitante festejava discretamente, talvez ainda sem acreditar que seu time obtivera a classificação mesmo sob tamanha “fumaceira”.
Após aquele embate, o tricolor, recuperado, conquistou o Gauchão e, na seqüência, a primeira Copa do Brasil. Mas, enquanto forem lembradas essas vitórias, será inevitável recordar que, para tanto, o Grêmio teve que subir a Serra e vencer a “Guerra de Vacaria”, um dos maiores jogos da história do futebol gaúcho. Para o “Leão” o jogo assinalou o clímax da época mais próspera e vitoriosa do clube, chamando para si as atenções do Rio Grande e do Brasil. Após aquele ciclo feliz, jamais veríamos a comunidade tão unida em torno de um único objetivo…” (Site Oficial do Glória)

Foto: Valdir Friolin (Zero Hora)
Edinho: “Em 1989, o meu papel era o de não se envolver com o caldeirão. No jogo contra o Glória, no qual precisávamos ganhar de qualquer maneira, houve um pênalti. Percebi que ninguém queria pegar a bola e bater. Era o clima pesado. Como recém tinha chegado, eu estava fora deste ambiente. Cobrei com toda a calma e fiz o gol.” (ClicRBS, 28/08/2010 18h07min)

Foto: Zero Hora
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Fonte: Livro “Gauchão: A História Ilustrada De Uma Tradição“
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Foto: Zero Hora
Glória 1×2 Grêmio
GLÓRIA: Gasperin; Chimbica, Vladimir, Juarez e Francisco (Zé Roberto); Edmílson (Paulão), Jair, Branco e Edmundo; Rubinho e Zé Cláudio
Técnico: Daltro Menezes
GRÊMIO: Mazaropi; Alfinete, Luiz Eduardo, Edinho e Hélcio; Jandir, Cristóvão e Cuca; Almir, Kita (Marcus Vinícius) e Paulo Egídio (Amaral).
Técnico: Cláudio Duarte
Gauchão 1989 – Segundo Turno – 7ª Rodada
Data: 30 de abril de 1989, domingo
Local: Estádio Altos da Glória, em Vacaria-RS
Público: 8.510 (7.213 pagantes)
Renda: NCz$ 17.096,00
Árbitro: Carlos Martins
Assistentes: Carlos Kruse e Justimiano Gularte
Cartões amarelos: Rubinho e Zé Cláudio
Cartão vermelho: Edinho (33/2ºT)
Gols: Almir, aos 30 minutos do 1º tempo; Edinho (de pênalti) aos 27 minutos do 2º tempo e Zé Cláudio, aos 37 do 2º tempo